quarta-feira, 20 de julho de 2011

Chá da Tarde... Lúcia Sauerbronn

Julho - mês de férias... aproveitando para fazer cursos e melhorar meu curriculo profissional...

Entre uma viagem e outra encontro um tempinho para reler alguns livros... decide reler as crônicas da Lúcia...

Compartilhando com meus amigos, no Dia do Amigo: a minha juventude foi mais ou menos assim:

Um Encontro

Ele estava coberto até as orelhas... estranhei os óculos que escondiam os belos olhos de um azul profundo. Havia também alguns fios de cabelos a menos, mais marcas em torno da boca e da testa. A postura parecia levemente arqueada, o passo mais lento. Mesmo assim não pude deixar de reconhecê-lo...como é que eu poderia esquecer "aquele modo só seu de andar, que tanto agradava as pequenas mulheres do meu tempo"?

Não pude evitar que meu coração acelerasse...

Talvez as mulheres confessem menos. Mas os homens estão cansados de se referir, cheios de saudade, a esse amor precoce.

Qual de Nós não amargou uma paixão por um professor do ginásio?

Até conhecê-lo, eu tinha sido uma nulidade em matemática, acumulando tantos vermelhos e amarelos que o meu boletim mais parecia um semáforo. Por isso meus pais não cansavam de elogiar as qualidades do tal professor... mal sabiam eles que era a simples vontade de agradar ao primeiro amor.

Acontece que o objeto da paixão era compartilhado com centenas de outros corações amargurados, que suspiravam entre raizes quadradas e regras de três...corações que esperavam ansiosas pelo intervalo das aulas para gastar o tempo na janela da sala dos professores, apenas para vê-lo beber o café em pequenos goles. Ao toque do sinal, todos saíamos em disparada para conseguir um lugar ao longo do corredor para vê-lo desfilar, sério, entre a pequena multidão de professores. Trazia sempre os livros numa das mãos; na outra, segurava o cigarro para a última tragada, antes de entrar na classe.

Seu nome estava sempre presente em nossa conversas nas filas, nos banheiros e na cantina. E não só porque ele era um dos pouquissimos representantes do sexo masculino naquela escola de mulheres. Havia também um professor de português, empolgado demais, outro de história tão amigo que podia ser confundido com um tio querido... naquele Homem havia alguma coisa de especial e misteriosa... talvez estivéssemos apaixonadas pelo jeito contido com que cumprimentava a todas, despertando em cada uma o desejo de receber uma atenção especial.

Contudo, em nenhum momento ele alterou aquele meio sorriso, dando a impressão de que todas desfrutávamos das mesmas remotas chances. Todas as manhãs, ao entrar na classe, ele apagava a palavra matemática ... nos divertiamos apostando se ele seria capaz de descobrir quem tinha feito a arte, o que na verdade era impossivel: cada letra era cuidadosamente desenhada por grupos que se revezavam a cada nova aula. Criatividade de adolescentes apaixonadas.

Essa paixão era uma brincadeira gostosa com que recheávamos os dias á espera de que o amor palpável surgisse em forma de principe encantado, como era costume sonhar naquela época.

Nosso professor sabia que ocupava lugar precioso, inesquecivel em nossa transformação de meninas em MULHERES... e o amávamos em conjunto porque era idolo inascessivel, como seriam depois os Beatles, Roberto Carlos e Mick Jagger. Era bonito ter um Amor Platônico.

Três décadas se passaram até aquela tarde em que o reencontrei... sozinho, acessivel, passeando tranquilo pelo centro da cidade. Num impulso, atravessei a rua para trocar um abraço com o passado. Pensei que fosse divertido relembrar antigos fatos, situações, pessoas, perguntar se em algum momento ele se dera conta da dimensão que tomara o nosso amor em massa. Mas, a um passo de distância, apenas fiz um leve aceno de cabeça, que ele retribuiu com a mesma gentileza, meio espantado.

Fiquei algum tempo matutando sobre a minha falta de coragem. Achei primeiro que foi por medo de que não me reconhecesse: cresci, envelheci... e trinta anos modificam muito a feição de uma mulher...

Depois pensei que, mesmo depois de tantos anos, eu ainda guardava respeito por sua postura de professor...

Ou, quem sabe, porque os povos antigos ensinavam que um verdadeiro idolo jamais deve ser quebrado."

Compartilhando ...

FELIZ DIA DO AMIGO






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